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quinta-feira, 11 de janeiro de 2018

Parecer da AGU provoca onda de despejos, morte e desesperança para indígenas Guarani Kaiowá e Terena no MS

Parecer do governo Temer paralisa demarcações e reforça onda de despejos contra comunidades indígenas no Mato Grosso do Sul
Indígenas Terena reúnem projéteis utilizados pela Tropa de Choque em reintegração de posse contra retomada em Dourados (MS), no início de dezembro. Foto: Povo Terena
Projéteis utilizados pela Tropa de Choque em reintegração de posse contra retomada Terena em Dourados (MS), no início de dezembro. Foto: Povo Terena
Os efeitos do Parecer 01/2017 da Advocacia-Geral da União (AGU), o chamado Parecer Antidemarcação, já podem ser sentidos pelos povos indígenas do Mato Grosso do Sul, sobretudo na região de Dourados. O estado possui um acentuado passivo com relação à regularização fundiária de territórios tradicionais no país. 
 
O parecer tem a função de manter o quadro como está, apontam as lideranças indígenas, na medida em que obriga toda a administração pública a aplicar as condicionantes estabelecidas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para a Terra Indígena Raposa Serra do Sol. Entre elas está a tese do marco temporal, que restringe os direitos territoriais dos povos definindo que só podem ser reconhecidas as terras que estivessem sob sua posse em 5 de outubro de 1988.
 
Existe uma crise humanitária na Reserva de Dourados se arrastando há pelo menos duas décadas. Os 16 mil indígenas Guarani Kaiowá e Terena vivem confinados em três mil hectares e buscam terras para “desafogar” a situação. Para a Reserva os indígenas foram levados no decorrer do final da primeira metade do século XX, como política de colonização de “terras devolutas” do então estado do Mato Grosso, e em 5 de outubro de 1988 estes povos não estavam nas terras tradicionais de onde foram retirados com violência. Dessa maneira, a cada retomada ou ocupação de terra fora da Reserva, estes indígenas sofrem ações de reintegração posse que desde o ano passado têm como principal argumento deferidor a tese do marco temporal.
 
“Por seu caráter amplo, e também por ser da AGU, o parecer possui capacidade de influenciar a Justiça Federal. Afinal, é uma posição do Poder Executivo – o poder que tem a responsabilidade administrativa pela demarcação. Como a retomada de terra é a alternativa dos povos para garantir o território tradicional, esse parecer é o combustível necessário para abastecer a usina de reintegrações de posse, com destaque para as decisões de primeira instância”, declarou a jornalistas de Brasília uma das coordenadoras da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), Sônia Guajajara.

Neste contexto se encontra uma ocupação Terena reintegrada à força pela polícia, no início de dezembro. O grupo, composto por oito famílias (cerca de 50 pessoas) e oriundo da Reserva, foi surpreendido pela Tropa de Choque. Os acessos ao sítio em que os indígenas estavam foram fechados.
 
Tratores destruíram casas e dezenas de indígenas foram atingidos pelas balas de borracha e bombas de gás lacrimogêneo. “Parecia que estavam preparados para uma guerra. Foi horrível. Atacaram com tudo, não tivemos nem tempo de reagir. Quando percebemos já estávamos na rodovia. A interditamos em protesto e mais uma vez a Tropa de Choque chegou atirando balas de borracha, bombas. Uma desumanidade”, explica Zuleica Terena.

Para os integrantes do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) Regional Mato Grosso do Sul, trata-se de um movimento de despejos reforçado agora pelo parecer.

 Indígena exibe marcas de bala de borracha após violenta reintegração de posse contra comunidade Terena em Dourados (MS). Foto: povo Terena
“Ano passado tivemos Apyka’i, Itapoty e Nhu Vera. Sempre a partir da Reserva. Então há um aumento de violência na região de Dourados. São centenas de indígenas que não cabem na Reserva. Buscam novas ocupações ou retomadas e sofrem represálias dos policiais em ações violentas de despejo”, destaca o missionário Matias Benno.

“Isso mostra quais serão os próximos passos da polícia em Dourados e já deixa a sombra do desespero pairando sobre todas as áreas. Sem dúvida o Parecer da AGU é um elemento a mais para aumentar a preocupação: com as demarcações paralisadas, os indígenas vão para as retomadas. Com isso, novas reintegrações baseadas no marco temporal podem ocorrer com a truculência policial”, destaca a missionária do Cimi Regional MS, Lídia Farias de Oliveira.
 
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