O Fórum 21, organização da sociedade civil constituída em dezembro, organizou
uma Carta em defesa de temas caros a todos nós. A comissão final de redação foi
formada entre outros por Luiz Gonzaga Belluzzo, Ladislau Dowbor, Leda Paulani,
Reginaldo Moraes. A Carta tem apoio de vários movimentos sociais que secundaram
o manifesto lido no Senado Federal, dias atrás. A Carta amplia os temas do
manifesto para discutir outras reformas populares e conclama as forças de
esquerda para formar uma frente para defendê-las. Se concordar com seus termos,
por favor responda a Joaquim Palhares – <jpalhares2@gmail.com>
O pacto político
e social da Constituição de 88 está sob um ataque de exceção. Contra a
política, contra os partidos, especialmente do campo da esquerda, contra os
movimentos sociais.
Este ataque representa
a maior ofensiva organizada pelas forças políticas da direita e pelo oligopólio
da mídia conservadora, desde 1968.
A luta contra a
corrupção, que deveria atingir de forma indistinta e igual quem viola a
legalidade e desmoraliza a política e o Estado, está sendo instrumentalizada
por setores conservadores e foi colocada a serviço de um projeto autoritário de
restauração de uma democracia restrita e de redução das funções públicas do
Estado.
Parte da direita
não hesita em clamar pela intervenção militar, como se o Brasil fosse uma
república bananeira, e as nossas forças armadas fossem feitoras dos interesses
do capital financeiro.
Promovem a
contrarreforma política para manter o FINANCIAMENTO empresarial
de campanhas eleitorais e partidos políticos e buscam terceirizar o Banco
Central, pretendendo sua “independência” em relação ao Estado e sua submissão
total à especulação globalizada.
Agendam a
redução da maioridade penal e organizam ataques às conquistas das mulheres,
negros e homossexuais. Incitam o ativismo judicial seletivo, antidemocrático,
para desestabilizar o pacto político de 1988.
A direita e o
grande empresariado promovem agora uma reforma penosa aos trabalhadores, para
universalizar a terceirização, com um ataque severo às conquistas laborais do
século passado. Aprovada, terá como efeito mais grave maior precarização das
relações de trabalho e a redução de salários.
A democracia:
reforma política e dos meios de comunicação
No Brasil, a
luta pela democratização da política assume, hoje, duas formas principais.
Primeiro, a luta
contra o FINANCIAMENTO empresarial
de campanhas eleitorais e dos partidos políticos.
Segundo, a luta
contra o controle plutocrático dos meios de comunicação, que são objeto de
concessão pública e sequer respeitam as regras constitucionais do seu uso.
Contra a
decadência do sistema político, as esquerdas e as forças comprometidas com a
democracia e com o avanço social precisam se unir em torno da reforma política
e pela democratização dos meios de comunicação.
Unir-se pela
verdadeira liberdade de imprensa, que implica no direito à livre circulação da
opinião, normalmente censurada pelos oligopólios, e pela transparência e
democratização das concessões para rádios e TVs, que hoje são feitas no subsolo
da política nacional.
As duas reformas
são fundamentais para controlar o papel que o dinheiro exerce como agente
corruptor da democracia.
No que concerne
à reforma política, o principal mecanismo de democratização de campanhas
eleitorais e prevenção contra a corrupção é o bloqueio do FINANCIAMENTO empresarial
de campanhas e partidos políticos.
No que tange à
reforma dos meios de comunicação, para limitar o poder do dinheiro é necessário
limitar a propriedade e o controle, em uma mesma área de concessão pública, de
órgãos de comunicação originários de uma mesma propriedade.
O controle de
grupos milionários e de políticos sem escrúpulos sobre meios de comunicação
confere vantagens políticas que pervertem a cláusula democrática e deformam as
eleições.
A agenda destas reformas
nos unifica, imediatamente, no seguinte:
a) proibição do FINANCIAMENTO dos
partidos e das campanhas eleitorais por empresas;
b) proibição de concessão
pública, em uma mesma área concedida, para mais de um veículo de comunicação do
mesmo grupo empresarial.
A democratização
do desenvolvimento econômico e a rejeição da austeridade
Apesar da crise
global, os defensores do projeto neoliberal não desanimam na defesa dessa
utopia direitista e dos interesses que ela atende.
Seu ataque quer
atingir o que diferenciou, no mundo, o desenvolvimento brasileiro na última
década: a expansão de salários e direitos sociais; a formação de um mercado
interno ampliado pelo aumento do consumo popular; a recuperação de alguma
capacidade de planejamento estatal; a rejeição do projeto de integração
subordinada à globalização neoliberal.
A direita
emparedou o Governo da Presidenta Dilma Rousseff em função da dominação que o
dinheiro exerce na formação da opinião, por meio dos oligopólios da mídia,
aproveitando os erros cometidos na formação dos preços públicos, na manutenção
de alguns subsídios, combinados com a elevação das taxas de juros e a retração
do INVESTIMENTO público.
Todo ajuste
ortodoxo de corte neoliberal se assenta em dois pilares: juros elevados e
restrições orçamentárias para INVESTIMENTOS em
infraestrutura e para programas de combate às desigualdades sociais e
regionais.
O “ajuste”
̶ como
proposto no Brasil ̶ não toca nas desigualdades de patrimônio e
renda, penaliza principalmente os trabalhadores e camadas sociais vulneráveis, fragiliza as
forças progressistas diante do avanço das forças conservadoras.
O nosso “ajuste”
deve ser outro. Deve garantir o crescimento com a ampliação dos INVESTIMENTOS para
combater desigualdades sociais, regionais e gargalos produtivos. Deve
potencializar um projeto de nação democrática e justa: a democratização da
estrutura tributária brasileira é essencial para que o desenvolvimento soberano
e inclusivo receba a contribuição dos que podem contribuir mais.
Nesse sentido, o
Imposto de Renda deve ser reduzido para trabalhadores e camadas médias, mas
majorado, progressivamente, para grandes salários e lucros distribuídos.
A tributação da
riqueza acumulada deve contar com Imposto sobre as Grandes Fortunas e Grandes
Heranças.
Finalmente, deve
ser veementemente repelida a proposta de eliminar a independência do Banco
Central em relação aos bancos que deve regular.
Depois do
repúdio do povo brasileiro durante a campanha presidencial à proposta de um
Banco Central “Independente” (em relação ao governo eleito), reavivá-la no
Congresso Nacional é uma atitude que denota um enorme afastamento dos
representantes do povo em relação aos interesses da maioria da nação.
A agenda mínima
de reformas que nos unifica, imediatamente, quanto ao desenvolvimento,
fundamenta-se no seguinte: rejeição da austeridade que é inepta para a retomada
do crescimento; redução das taxas de juros; retomada do INVESTIMENTO público;
reestruturação imediata do Imposto de Renda, com aumento das alíquotas para os
muito ricos; taxação de Grandes Fortunas e Grandes Heranças; programa de largo
alcance e qualidade técnica para combater a sonegação de impostos, políticas
que devem ser debatidas na cena pública democrática, tanto no Parlamento como
na relação direta do Governo com a sociedade.
Participação
direta da cidadania nas decisões sobre políticas públicas
A Constituição
Brasileira abre a possibilidade de participação direta da cidadania (art. 14) e
a Lei de Responsabilidade Fiscal (LC 101/1999) recomenda que os governos
procedam discussões públicas sobre o Orçamento.
Esses preceitos
ainda não se materializam em instituições e práticas efetivas. Consultas
públicas, plebiscitos e referendos não devem ser eventos raros em uma
democracia ampliada.
É necessário
construir mecanismos que efetivem a participação direta e desenvolvam a
democracia na definição de políticas públicas, prioridades orçamentárias e
formas de financiá-las que ampliem a justiça social.
Pela defesa da
democracia, do trabalho e da soberania nacional
Diante do avanço
da direita, é necessário pensar hoje não apenas na estabilidade e na
governabilidade democrática, mas na defesa de um programa mínimo que unifique
as forças sociais comprometidas com a defesa da democracia, do trabalho e da
soberania nacional.
Para construir,
debater e defender esse programa, é fundamental a constituição gradual de uma
Frente Democrática pelas Reformas Populares. Uma Frente que aponte, nos
processos eleitorais e nas lutas sociais, para uma nova governabilidade com
base programática.
A formação desta
Frente é uma tarefa política de toda a esquerda, com participação ampla da
sociedade civil não organizada em partidos e membros de partidos.
Lutamos há
décadas pela democracia contra as mesmas forças do atraso que, hoje, querem
voltar a limitá-la. Lutemos em conjunto para que a democracia brasileira supere
a nova ameaça reacionária, e atenda progressivamente aos anseios do povo
brasileiro por menores desigualdades, mais direitos e oportunidades de vida
digna.
Fonte: leonardoBOFF.com