Frente ao genocídio sofrido pelas populações indígenas no Brasil e ao retrocesso político aprofundado pelo governo de Michel Temer, a delegação irá denunciar as violações aos direitos humanos e a ofensiva ruralista contra os direitos indígenas.
“É a minha terceira vinda na ONU trazendo a nossa realidade, contar do massacre desumano que os indígenas estão sofrendo, o que o Brasil está fazendo com os povos indígenas”, comenta a liderança Guarani Kaiowa Elizeu Lopes, representando o Aty Guasu (Grande Assembleia Guarani e Kaiowa) e o Conselho Continental da Nação Guarani na delegação brasileira.
Na próxima segunda, 19, os indígenas se reunirão com representantes do governo brasileiro, na Missão Permamente do Brasil junto à ONU. “A gente vem aqui dizer que tem genocídio, que tem violência”,comenta Elizeu. “E com todo mundo sabendo, achamos que isso pode ajudar a cobrar a responsabilidade o governo do Brasil, para eles pararem de ser desumanos e assumir que fazem massacre com impunidade”.
Na terça, 20, a relatora especial sobre assuntos indígenas da ONU, Victoria Tauli-Corpuz, irá apresentar o relatório da missão no Brasil, realizada em março deste ano, durante a sessão do Conselho de Direito Humanos, onde Elizeu Lopes também fará um pronunciamento.
Na quarta-feira, 21, lideranças realizarão um evento paralelo à reunião do UNHRC. Intitulada “Direitos indígenas: perspectivas em tempos de retrocesso e violência no Brasil”, a mesa de debates será composta pela Guajajara e representante da Articulação dos Povos Indígenas no Brasil (Apib), Sônia Bone; pelo Guarani Kaiowa Elizeu Lopes; e pelo Yanomami e fundador da associação Hutukara (HAY), Davi Kopenawa.
Ainda, comporão a mesa o procurador da república no Mato Grosso do Sul, Marco Antonio Delfino, e a relatora especial, Victoria, além Ana-Maria Suarez Franco, da Food First Information and Action Network (Fian International). Ainda, estarão no plenário do evento a Pankararu Cristiane Julião, a Taurepang Telma da Silva e a Xavante Samantha Juruna, convidadas pela ONU Mulheres.
Durante o evento, serão lançados o Relatório Anual de Violência Contra os Povos Indígenas do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), além do estudo “O Direito Humano à Alimentação Adequada e à Nutrição do Povo Guarani e Kaiowá: um enfoque holístico”, realizado em parceria pela Fian Brasil, Fian International e Cimi, e que denuncia a grave situação nutricional e da segurança alimentar dos Kaiowa e Guarani no Mato Grosso do Sul.
O Guarani Kaiowa Elizeu Lopes, durante visita da relatora ao tekoha Kurusu Ambá. foto: Phil Clarke Hill
Elizeu espera que tanto Brasil como os estados, em especial o Mato Grosso do Sul, saiam constrangidos após a apresentação da relatora. “O caso dos Guarani e Kaiowa é urgente, e não dá mais de esperar trinta, quarenta anos. É muito racismo e genocídio, não tem punição, e o governo não demarca as terras.
Quem tá morrendo somos nós. Como não fazem nada, nós não vamos parar de fazer retomada. A gente necessita de espaço. A luta não vai parar. A retomada vai continuar. Estamos defendendo a vida, para nós a terra é vida, é Yvy, é sagrado”.
Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (UNHRC)
Principal órgão intergovernamental responsável por promover o respeito universal e a proteção de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais, o UNHRC é composto por 47 Estados membros, e articula-se com os diversos mecanismos e mandatos de direitos humanos constituídos por tratados internacionais.
Analisa violações flagrantes e sistemáticas, bem como promove as Revisões Periódicas Universais (UPR), quando um Estado membro é submetido a uma avaliação geral acerca do cumprimento e defesa dos Direitos Humanos. Em 2017 será inaugurado o 3º ciclo das UPR e o Brasil será um dos países examinados.
Relatora da ONU, Victoria Tauli-Corpuz, durante sua visita aos Tupinambá, na Bahia. foto: Renato Santana/Cimi
Missão da ONU no Brasil
A relatora especial da ONU para os Direitos dos Povos Indígenas, Victoria Tauli-Corpuz, esteve no Brasil, liderando uma missão internacional da ONU, entre os dias 7 e 17 de março deste ano.
Visitou terras indígenas em situação de conflito fundiário, símbolos da falta de garantia de direitos humanos e sociais destes povos, na Bahia, no Pará e no Mato Grosso do Sul - neste último, Victoria esteve na área onde vive Elizeu Lopes, o tekoha Kurusu Ambá, que sofreu um ataque de pistoleiros logo após sua visita.
Esses estados e terras indígenas tinham sido visitados pelo predecessor de Victoria na Relatoria Especial da ONU sobre Direitos Indígenas, James Anaya, em 2008. O objetivo da visita de Victoria foi o de verificar se as recomendações de Anaya tinham sido atendidas pelo governo brasileiro e fazer outras, conforme o que se constatasse durante o roteiro de viagem.
No relatório que será apresentado terça-feira na ONU, a especialista transmitirá suas impressões sobre a viagem e fará recomendações ao governo brasileiro. Na avaliação de Victoria, “há uma inquietante ausência de avanços para a implementação das recomendações do Relator Especial e na solução de antigas questões de vital importância para os povos indígenas” no Brasil.
Em março, ao fim de sua visita, a relatora afirmou que “os riscos enfrentados pelos povos indígenas estão mais presentes do que nunca desde a adoção da Constituição de 1988”.
“Eu não quero voltar daqui para a aldeia, e simplesmente dizer que eu vim aqui na ONU. Eu não vim passear na Suíça. Também não queremos que a visita da relatora da ONU no Brasil seja lembrada como uma caravana de turistas. Esse relatório tem informações muito sérias, tem que servir para pressionar, o governo brasileiro precisa ouvir que nós somos contra a Portaria 303, a PEC 215, o marco temporal”, explica Elizeu.
Cimi com status consultivo
Recentemente, o Cimi obteve status consultivo especial no Conselho Econômico e Social (ECOSOC) da Organizações das Nações Unidas (ONU), tendo reconhecida sua competência especializada e a experiência prática da entidade na questão indígena, permitindo que ela contribua nos trabalhos das Nações Unidas,e sendo permitida sua participação como observadora nas sessões do Conselho de Direitos Humanos, e podendo apresentar moções por escrito e intervenções orais.
Fonte: CIMI- Conselho Indigenista Missionário