O povo dos países pobres se mata trabalhando para financiar o desenvolvimento dos países ricos.
O povo dos países pobres se mata trabalhando para financiar o desenvolvimento dos países ricos. O Sul financia o Norte, e especialmente, as classes dominantes dos países do Norte. O meio de dominação mais poderoso atualmente é a dívida.
Os fluxos de capitais Sul-Norte têm excedentes com relação aos fluxos Norte-Sul. Os chamados países “pobres” pagam anualmente às classes dirigentes dos países ricos muito mais dinheiro do que recebem delas, seja como investimentos, empréstimos, ajuda humanitária ou a chamada ajuda ao “desenvolvimento”. Os juros das dívidas mantêm as pessoas na escravidão e saqueia seus recursos.
Esta espoliação ainda por cima é agravada, durante estas últimas décadas, com a aparição dos fundos abutre, chamados assim pela forma como atuam, como aves de rapina. São fundos de investimentos especulativos, muitos deles registrados em paraísos fiscais e que são especializados na compra de dívidas que se vendem por baixo do seu valor nominal, com o fim de obter máximos benefícios.
Estes fundos especulativos são propriedade de indivíduos extremamente endinheirados que se encontram entre os mais terríveis predadores do sistema capitalista. Conseguem dispor de botins de guerra de milhares de milhões de dólares. Comandam batalhões de advogados capazes de abrir procedimentos nos cinco continentes, durante dez ou quinze anos se for necessário.
Os fundos abutre matam.
Vejamos um exemplo: em 2002, devido a uma sequia espantosa, a fome provocou a morte de dezenas de milhares de seres humanos em Malaui. Dos 11 milhões de habitantes desse país do sudeste da África, 7 milhões se encontravam gravemente subalimentados.
O governo local era incapaz de ajudar as vítimas porque alguns meses antes teve que vender no mercado os estoques de reserva de milho (40 mil toneladas!) para pagar um fundo abutre. Esse fundo obteve de um tribunal britânico uma sentença contra o Estado de Malaui que o obrigava a pagar várias dezenas de milhões de dólares.
As eleições na Argentina aconteceram em dezembro de 2015. O candidato designado pela coalizão de esquerda, que deveria prosseguir no combate contra os fundos abutre, era o favorito segundo todas as pesquisas, mas finalmente foi derrotado por um político local de direita, que gastou recursos astronômicos para ganhar. Assim que assumiu o cargo, o novo presidente da Argentina, Mauricio Macri, declarou que pagaria sem atraso todas as demandas provenientes dos fundos abutre. E foi isso que ele fez!
A prosperidade dos fundos abutre ilustra de maneira caricaturesca o poder da plutocracia. A acumulação das maiores riquezas nas mãos de alguns poucos, e a consequente desigualdade derivada dessas operações, são possíveis graças à eliminação da normativa estatal, a abolição do controle aos bancos, a formação de monopólios privados, a proliferação de paraísos fiscais, etc.
Essa desigualdade conduz inexoravelmente à destruição da relação de confiança entre os cidadãos e seus dirigentes. Quando os Estados se debilitam e os oligarcas sem fé nem lei governam o planeta, quando uma ordem criminal substitui o Estado de direito, quem ainda pode se aventurar à pretensão de proteger o bem público e o interesse geral?
Algumas palavras finais sobre os fundos abutre. O libertador cubano José Martí foi quem chegou à seguinte constatação: “a verdade, uma vez desperta, não volta a dormir jamais”. Paul Singer, que encabeça vários fundos abutre, certamente ganhou a batalha contra o povo argentino e contra muitos outros povos da África, da Ásia e do Caribe. Mas ele e seus semelhantes foram tirados das sombras, e colocados em evidência. Criou-se consciência. Um dia, outros levarão esse combate mais longe.
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Adaptação de texto; Cicero Do Carmo