O Brasil lidera, pelo quarto ano consecutivo, a lista de países que mais tiveram ativistas ambientais e agrários assassinados compilada pela ONG internacional Global Witness e divulgada nessa segunda-feira.
Das
29 mortes de líderes e militantes de causas ambientais ou agrárias registradas
no país no ano passado, 26 delas estavam ligadas a conflitos de terra.
Quatro
das vítimas eram indígenas.
O
Brasil está à frente de países como Colômbia (25 mortes em 2014), Filipinas (15
mortes) e Honduras (12 mortes). Desde 2002, só houve um ano, 2011, em que o
país não liderou esta lista. Ao todo, 477 "ativistas ambientais ou
agrários" foram assassinados no país desde 2002, segundo a ONG.
A
ONG adverte que esses números podem estar subestimados.
"Essa
é uma crise oculta que está escapando da opinião pública, primeiro porque não é
monitorada de forma adequada pelos governos, e também porque muitos ativistas vivem
em comunidades pobres e remotas, com acesso limitado aos meios de comunicação e
à mídia", diz o relatório.
A
Comissão Pastoral da Terra (CPT), que monitora a violência no campo há 30 anos,
diz que, em 2014,
foram mortos 36 ativistas de causas da terra e do meio ambiente no país.
Segundo a CPT, o Estado mais violento foi o Pará, onde ocorreram nove mortes,
seguido por Maranhão e Rondônia (cinco mortes cada).
"Você
tem que se apegar a Deus. Nessas condições em que o Estado não funciona, não
tem segurança nenhuma, se for pensar bem, você desiste, porque o risco é
permanente", diz Siqueira.
"As
pessoas não confiam na Justiça. É uma terra de ninguém. Quando a lei ameaça
funcionar, acontece isso, vão ameaçar a vítima, que é testemunha."
A
Global Witness cita, como exemplo da violência no campo em 2014, o caso de
Raimundo Rodrigues da Silva, líder de uma comunidade rural no Maranhão.
Ele
levou um tiro e foi para o hospital e, enquanto estava internado, dois homens
tentaram sem sucesso entrar no seu quarto para matá-lo. Pouco tempo depois, ele
veio a falecer em decorrência dos ferimentos causados pela bala.
Impunidade
Para a Global
Witness, um fator que "complica" a violência no campo no Brasil
"é a falta de documentos oficiais da terra para comunidades indígenas ou
de camponeses". "Muitos dos suspeitos de (serem) mandantes desses
crimes de 2014 são poderosos latifundiários", disse à BBC Brasil Billy
Kyte, um dos principais autores do estudo.
A impunidade é o
fator mais citado no documento para justificar o alto número de assassinatos
ligados a questões ambientais e agrárias no mundo.
No Brasil, segundo
Billy Kyte, a impunidade também "é o maior problema". "O Brasil
precisa monitorar esses assassinatos e levar os responsáveis à Justiça. Existe
uma falta de vontade política (no país) para fazer justiça pelos mortos nesses
conflitos."
A Global Witness
diz em seu relatório que muitos mandantes de assassinatos de ativistas
"escapam" de investigações, "mas as informações disponíveis
sugerem que grandes latifundiários, empresários, políticos e agentes do crime
organizado frequentemente estão por trás desse tipo de violência".
Para Rubens Siqueira, da
Comissão Pastoral da Terra, a falta de punição "incentiva" a
violência no campo. Ele lembra o massacre de Eldorado de Carajás – quando 19
sem-terra foram mortos a tiro por policiais em uma marcha de protesto contra a
demora para a desocupação de terras em Eldorado dos Carajás, no Pará.
O massacre completou 19 anos na última sexta-feira e, até
hoje, ninguém foi punido.
"O caso de Eldorado é um caso clamoroso. É um país
de faz de conta, as autoridades lamentam, vão lá, mas nada acontece", diz
o coordenador da CPT.
"O Estado favorece esse processo de reciclagem da
violência, porque essa população fragilizada não tem a quem recorrer. A Justiça
demora, falha ou, quando acontece, livra o mandante. É um ciclo vicioso no
campo, que nunca parou e está sempre crescendo."
O ministro do Desenvolvimento
Agrário, Patrus Ananias, chegou a ir à Eldorado dos Carajás na sexta-feira e
reiterou seu compromisso com a "reforma agrária e a paz no campo".
Fonte: BBC Brasil
Fonte: BBC Brasil